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  • As duas metades da humanidade

    As duas metades da humanidade


    Há dias alguém me dizia que precisava de um advogado. Na dúvida, naquele contexto quanto ao sentido da palavra advogado, perguntei se era mesmo advogado, ou, indiferentemente, uma advogada. Afinal, esclareceu-se, podia ser uma advogada!

    Este é apenas um pequeno e real exemplo da importância do vocabulário nestas questões (e não só!) da igualdade entre homens e mulheres, já que a linguagem tanto pode servir para reproduzir as assimetrias e as desigualdades, ou, pelo contrário, ser um instrumento de promoção de uma desejável igualdade efectiva.

    Na realidade, não obstante a igualdade perante a lei, as mulheres continuam desfavorecidas por uma prática social e de mentalidade de séculos, sendo o desequilíbrio maior, por um lado, nas classes mais desfavorecidas e, por outro, na participação em processos de direcção e de tomada de decisão. Veja-se, a título exemplificativo, a chocante diferença, embora às vezes (mal) disfarçada, de salário diferente para trabalho igual, e, quanto aos centros de decisão, a disparidade tanto no topo da Administração Pública como no topo das empresas. Em Portugal, nunca tivemos uma Governadora do Banco de Portugal e têm sido excepção as Reitoras de Universidades, as Conselheiras no Supremo Tribunal de Justiça e as Bastonárias de Ordens profissionais.

    Esta desigualdade, de oportunidades e de tratamento, continua a ser uma realidade social da qual nem sempre estamos verdadeiramente conscientes. A igualdade que se pretende é a igualdade de género, isto é, o reconhecimento do papel social de homens e mulheres no desenvolvimento da humanidade.

    O pequeno exemplo com que iniciámos este escrito mostra como a ideia de homem, enquanto conceito abrangente de ser humano, masculino e feminino, é redutora da mulher, vista, desse modo, como o ser específico da humanidade em contraponto ao homem como ser global. Se as palavras influenciam o pensamento, e influenciam, mudar este paradigma masculino como representação do género humano pode ajudar à desejável e efectiva mudança de mentalidades: homens e mulheres são as duas metades da Humanidade!

    Ivone Cordeiro, Advogada l Artigo publicado na revista Cais em 2010, revisto em 2018